domingo, 14 de dezembro de 2008

Uma munição de 5.56x51mm AP: Ressuscitando o Projétil de 5.56mm


O que torna o calibre 5.56x45mm inóquo nos dias de hoje não é tanto o seu projétil, de apenas 4 gramas de massa, mas principalmente a dificuldade de se ter uma arma para CQB de dimensões razoáveis, nos moldes do que os especialistas têm considerado necessário na atualidade, quando a munição em questão requer passos de 7 e 9 polegadas. Os rifles de assalto mais compactos, como a M4A1 Commando, por outro lado, não podem ter canos de mais de 10.5 polegadas e, com esse comprimento de cano e passos de 9 polegadas, os projéteis não ganham pressão suficiente para terem sequer o seu em si já polêmico desempenho normal completo.

Eis um problema impossível de equacionar dentro dos cartuchos da munição SS-109, de 45mm de comprimento por 9.58 mm de diâmetro na base. Por conta disso, há um retorno às submetralhadoras no calibre 9mmP em várias partes do mundo: estas tem dimensões mais compactas e calçam, na sua maioria, munições com maior poder de parada do tipo “armor piercing”, exceção feita à MP7A1, que usa a munição 4.6x30mm, com menos “stopping power”, porém imenso poder de perfuração. Estas armas superam em tudo os rifles compactos em 5.56x45mm para CQB.

Restam os rifles com maior comprimento de cano e com maior alcance neste calibre. Entretanto, quando se queira rifles mais longos e de maior alcance para entreveros a longa distância, são novamente os fuzis de potência plena, em 7.62x51mm, que se empregam e já não mais os outrora considerados polivalentes fuzis em 5.56x45mm.

Nós, porém, temos uma idéia para “ressuscitar” o projétil de 5.56mm, se bem que este passará a ser empregado numa arma que não faz parte da família AR-15/M-16/M4.

Falo de um rifle que dispensa a colocação de preservativos sobre a boca do cano em dias de chuva ou umidade intensa; pelo contrário, pode ser submerso em água, coberto de lama ou areia e continuar operando.

Falo sim, com certeza, do nosso proficiente FAL, arma básica das FFAA brasileiras.

Para tornar possível esta empresa, de disparar balas de 5.56mm do FAL, não iremos pensar em reconstruir ou modificar drasticamente essa arma legendária, mas apenas em mudar o seu cano, com um mínimo de alterações no "upper", utilizando-nos, de preferência, de um sistema de encaixe modular. Esses sistemas são utilizados nos ditos “canos de troca rápida” como os do FN SCAR e do rifle “sniper” PGM Ultima Ratio, só para citar dois exemplos dignos de nota.


No vídeo abaixo, um militar demonstra como funciona o sistema de troca rápida de canos do fuzil PGM Ultima Ratio Commando II, permutando calibres inclusive, em aproximadamente 35 segundos.


Com um sistema de troca rápida incorporado à base do cano do nosso FAL, ou melhor ainda, do nosso FAP, troquemos agora o cano padrão da arma por um outro cano construído dentro dos ditames de precisão da FI (Fábrica de Itajubá), com martelamento a frio, porém usemos raiamento e passos de sete polegadas calibrados para estabilizar e conferir pressão ideal a um projétil de 5.56mm.

Ainda uma vez, a base deste conceito será a adaptação da munição à arma e não o inverso, na medida do possível.

Modifiquemos, pois, um cartucho “standard” de 7.62x51mm de modo que o diâmetro da base do estojo continue medindo 11.94 mm e apenas o "neck" se vá estreitando para medir 6.43 mm (como o da munição SS-109) de forma a caber uma ponta de 5.56mm.

Essa munição vai passar a se chamar aqui MX-Brazilian 5.56x51mm, conservando exatamente o mesmo comprimento e diâmetro de base do 7.62x51mm. Apenas a ponta em si foi alterada e as dimensões do “neck” que a sustenta. Há talvez até mais espaço no estojo para acomodar o propelente, pois que a ponta é menor em diâmetro e comprimento, mas também não vamos mexer, por ora, na quantidade ou na qualidade do propelente. Vamos manter o nível de energia liberada no “default”: 3,352 joules. Acredito que o poder de perfuração da bala de 5.56mm seja bastante potencializado com essa liberação de energia que a tornará ainda mais veloz e precisa.

É tempo de relembrar, sem entrar em detalhes aqui, os estudos do Dr. Martin Fackler sobre os efeitos que um projétil neste diâmetro teria em um alvo mole quando utilizando a carga padrão da munição SS-109, que libera 1,767 joules, para sopesarmos o que essa mesma ponta pode fazer quando propelida com a carga plena do calibre 7.62x51mm, que libera 3,352 joules. Segundo Fackler, o projétil de 5.56mm causaria cavidades temporárias muito amplas e letais...

Ora, permutando-se os canos de troca rápida, têm-se novamente um FAP capaz de disparar com a munição 7.62x51mm “standard”; nada foi alterado no “upper”, apenas o cano foi trocado. Mesmo a regulagem da pressão sobre o êmbolo de gases persistirá a mesma.

Cumpre, finalmente, fazer a experiência de disparar os projéteis do nosso 5.56x51mm de canos curtos, quiçá, tão curtos quanto o da M4A1 Commando, 10.5 polegadas, ou um pouco maiores, 13 polegadas, como o da arma que é símbolo do nosso blog, um PARAFAL customizado pela DSA Inc. Deixo essa parte a quem de direito.

Só a experiência concreta poderia demonstrar os efeitos dessa munição idealizada aqui por simples hobbie e, ainda, se os níveis de energia — e quantidades de propelente —, podem ser reduzidos até parâmetros semelhantes aos do calibre 6.8x43mm SPC, por exemplo - 2,385 joules - de modo a que se tenha rajadas mais controláveis nesse nosso MX-Brazilian 5.56x51mm. A meu ver, para que um calibre como este se torne realmente justificável, faltaria ainda levar pontas do tipo “armor piercing” e com núcleos em aço alongados, que garantem, segundo experiências recentes, além de um alto poder de penetração, também um excelente “stopping power”.

A munição M995, de 5.56x45mm, fabricada pelos estadunidenses, com núcleo de tungstênio — material bastante caro — , é capaz de transfixar uma blindagem de aço de 12mm a 100 metros. A M993, de 7.62x51mm, dá conta de perfurar uma blindagem de 15mm de aço a 300 metros. Essa nossa MX Brazilian 5.56x51mm AP conjugaria as vantagens de uma e de outra para os empregos antimaterial e antipessoal a longas distâncias, e, com menos carga de propelente, para o emprego antipessoal em CQB, sobretudo contra blindagens corporais.

O vídeo abaixo mostra o procedimento para a permuta dos canos de troca rápida do FN SCAR para fins de adequação à tarefas específicas.


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EM APÊNDICE.

Para se ter um fuzil de fabricação nacional no calibre 5.56mm OTAN, com todas as peças de reposição manufaturadas no País, muito esforço mental tem sido despendido nas últimas três décadas e somas importantes de recursos têm sido gastas em pesquisas que ainda não chegaram a um resultado ideal.

Passo a transcrever um trecho de artigo do especialista em armas leves Alexandre Beraldi para o site Defesa Net em que é abordado o histórico do calibre 5.56mm OTAN no Brasil.


O calibre 5,56 no Exército Brasileiro

O início dos estudos que resultaram na adoção do calibre 5,56x45 mm pelo Exército Brasileiro remonta ao começo dos anos 80 e, assim como a evolução do armamento leve na Força Terrestre, está intimamente ligado à história da Fábrica de Itajubá (FI).

O objetivo, à época, era a obtenção de uma arma de concepção original, tanto quanto possível, e que guardasse analogias, notadamente de desempenho, com as similares estrangeiras de mesmo calibre. As dificuldades encontradas nos anos de 1981 e 1982 para a concretização de um protótipo fizeram com que o objetivo original do projeto fosse reavaliado em 1983. Essa decisão deu origem ao Fuzil 5,56 IMBEL MD1. O projeto desse fuzil previa uma caixa da culatra e carregador novos. Sua produção demandaria investimentos em processos, dispositivos, ferramentas e calibres, e o retorno do investimento estaria assegurado com um lote mínimo de 10.000 unidades comercializadas, meta improvável para aquela conjuntura.

A homologação dos Objetivos Básicos Operacionais (OBO) 39/86 foi decisiva para a definição de novo rumo. A previsão do Estado-Maior do Exército (EME) era dotar, inicialmente, apenas o Batalhão de Forças Especiais, que contava com 561 homens. Como a demanda prevista não justificava o desenvolvimento de projeto de uma arma nova, a FI optou por um fuzil que aproveitasse os carregadores do M16 e o máximo de peças e processos de fabricação do FAL, incluindo a caixa da culatra.

Dessa forma, em tempo relativamente curto, surgiram os modelos MD2 e MD3 – solução economicamente viável mas não ideal do ponto de vista técnico e operacional. O modelo MD2 era muito pesado se comparado aos outros fuzis de mesmo calibre. O protótipo, com a coronha rebatível, foi submetido à avaliação técnica no Campo de Provas da Marambaia como Material de Emprego Militar (MEM) tipo “E”, e seu desempenho foi considerado satisfatório. Apesar de nenhum dos protótipos ter sido submetido à avaliação operacional, o modelo MD2 passou a ser adotado por algumas Unidades do Exército e por diversas polícias. Para o mercado externo, continua sendo comercializado até os dias de hoje.

Em 1995, o EME reviu os Objetivos Básicos Operacionais para o Fuzil 5,56. Surgiu, daí, uma expectativa de demanda de um fuzil com diversas características não atendidas pela maioria das armas disponíveis no mercado internacional, incluindo o modelo IMBEL MD2 (ver Tabela 1). Na ocasião, os objetivos principais eram: desenvolver uma arma dentro dos limites de peso (3,8 kg) e inserir o mecanismo de rajada controlada (três tiros), colocando o protótipo com características próximas às de seus concorrentes.

Em dezembro de 1996, a FI solicitou ao Centro Tecnológico do Exército (CTEx) a avaliação técnica dos protótipos IMBEL. Esses protótipos não atingiram todos os requisitos absolutos, pois os Requisitos Técnicos
Básicos (RTB) do projeto só foram homologados em setembro de 1997 com a Avaliação Técnica (AVALTEC) já em curso.

Em novembro do mesmo ano, a FI apresentou novos protótipos em conformidade com os requisitos absolutos e com algumas modificações de caráter operacional sugeridas pelo Centro de Instrução de Guerra na Selva, que realizou uma avaliação preliminar de alguns protótipos. A AVALTEC foi reiniciada com a nova arma, mas, em junho de 1999, as provas foram interrompidas, dada a inexistência de critérios objetivos para avaliação de alguns requisitos. Esse fato levou o CTEx a decidir pela interrupção da prova para revisão dos RTB.

O período decorrido até a homologação dos novos requisitos permitiu à FI conduzir diversos testes e introduzir mudanças maiores, baseadas nas ocorrências e observações colhidas durante as avaliações anteriores, em uma avaliação operacional realizada pela Força Aérea Brasileira com 30 protótipos e em diversas sugestões de usuários e colaboradores. O resultado permitiu ao Fz 5,56 MD97L atingir todos os requisitos absolutos e a grande maioria dos requisitos desejáveis e complementares estabelecidos pelo EME.

O Fuzil 5,56 MD97L

Para conhecermos o Fuzil 5,56 MD97L, vale detalhar um pouco mais o fato que impediu o aproveitamento do projeto do FAL. O FAL possui um sistema de trancamento por ferrolho basculante, que vincula seu trancamento à estrutura da arma. Dessa forma, essa estrutura tem que ser construída num material que suporte os esforços exercidos no momento do disparo. A maioria dos demais projetos de fuzis automáticos no calibre 5,56x45mm utiliza sistema de trancamento por ferrolho rotativo, que se tranca diretamente no cano feito em aço. A caixa da culatra, nesse modelo, passa a ser apenas a estrutura que abriga e relaciona os sistemas de alimentação, trancamento, disparo e extração/ejeção da arma. Pode, conseqüentemente, ser fabricada com materiais mais leves e menos resistentes que o aço, visto serem menores as forças ali exercidas.



Seguindo a tendência dos demais fabricantes, a equipe de projetistas da IMBEL desenvolveu projeto de ferrolho rotativo com trancamento diretamente no cano, montado sobre uma caixa da culatra feita em liga especial de alumínio.

Os fuzis e carabinas 5,56 IMBEL MD97 são armas que funcionam por ação da força expansiva dos gases resultantes da queima da carga de projeção. Para o aproveitamento de tal força, que irá atuar no destrancamento do ferrolho, existe uma tomada de gases no terço médio do cano. Um diferencial importante é que, diferentemente de alguns fuzis, em que parte dos gases é conduzida por um tubo até uma câmara no interior do ferrolho, nos fuzis IMBEL os gases atuam sobre um êmbolo situado próximo à tomada de gases. Esse fato evita o acúmulo de resíduos provenientes da queima dos gases propelentes na crítica região do ferrolho.

A posição do sistema de gases acima da linha geral da arma permitiu, ainda, manter o centro de gravidade sobre o eixo longitudinal do fuzil. Tal fato, aliado ao dimensionamento do sistema de trancamento, permite que o destrancamento e a abertura da arma, durante o ciclo de funcionamento, só se dê após o projétil ter ultrapassado a boca da arma. Dessa forma, a precisão do tiro não é comprometida pelo deslocamento de massas, como ocorre em algumas armas automáticas.

Seu funcionamento, conforme a versão, pode ser de repetição, para o lançamento de granada de bocal; semi-automático, para a realização do tiro intermitente; ou automático, para rajadas controladas de três tiros ou tiro contínuo. O tiro pode ser realizado com a coronha na posição normal ou rebatida.

O cano, fabricado pelo processo de martelamento a frio, possui alma raiada recoberta com uma camada de cromo duro, a fim de aumentar a sua vida útil e facilitar a limpeza interna. O passo de raiamento de 1:10" (1:254 mm) segue a tendência atual de se ter passos intermediários entre 1:12" e 1:7". Esse valor intermediário é a melhor solução para que os projéteis mais pesados se estabilizem, sendo, ainda, bastante adequada aos mais leves. Dessa forma, o MD 97 tem uma balística externa e terminal adequada, independentemente do tipo de munição utilizada.

A alimentação faz-se por intermédio de carregadores com interface STANAG (compatível com os carregadores Colt M16A2), com capacidade para 30 cartuchos. Em cada avanço do ferrolho, é carregado um cartucho e, durante o recuo, ele é extraído e ejetado da arma. Tais operações se repetem enquanto houver cartuchos no carregador. Uma vez esvaziado o carregador, o ferrolho é mantido à retaguarda pelo retém do ferrolho, indicando que o usuário deve realimentar a arma. A opção de fornecer os carregadores também em aço confere maior durabilidade e confiabilidade se comparado aos de outros fabricantes, que adotam somente a opção em alumínio.

Seguindo uma tendência mundial, buscou-se o desenvolvimento de variantes do modelo original, como, por exemplo, as carabinas 5,56 IMBEL MD97. Como a própria nomenclatura indica, trata-se de versão “cano curto” do fuzil 5,56 MD97L. Assim como o fuzil MD97L, as carabinas MD97 também foram avaliadas e aprovadas. Apresentada nas versões semi-automática (modelo LC) e com rajada de três tiros (modelo LM), possui dimensões e peso reduzidos. Suas características são ideais para emprego por tropas especiais e para o trabalho policial. Nesse contexto, a Secretaria Nacional de Segurança Pública elegeu o modelo MD97LM para o treinamento da recém-constituída Força Nacional de Segurança Pública.

De uma maneira geral, no modelo MD97 foram adotadas diversas soluções já existentes, inclusive algumas do próprio FAL 7,62. Outras, como o sistema de rajadas curtas, constituem projetos inéditos que podem, também, ser adotadas para o FAL.

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Desmerecer todo esse esforço por parte dos nossos técnicos, diante de todas as dificuldades materiais de fundo político encontradas, é algo que nós não faremos em nenhuma hipótese.

Entrementes, pode-se ter um FAL e um PARAFAL livre de “bugs” e capazes de disparar projéteis de 5.56mm de diâmetro e, facultativamente, calçar a munição 7.62x51mm padrão, mediante a simples troca de canos modulares, sem que se venha a mexer no “upper receiver” ou nos carregadores da nossa arma básica. Para tanto, basta que se busque adaptar a munição à arma, mais do que a arma à munição.



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